quinta-feira, 10 de abril de 2014

Até que a morte nos separe

Eu morri e não lembro de ter visto a minha vida inteira me passar como um filme. Falando em vida, que vida tive eu? Quarenta e sete anos, trabalhei por quase vinte e cinco numa repartição pública, sem amigos, sem filhos, sem mulher; meus pais se foram oito anos antes de mim, fato que não me abalou em nada, eles moravam em Vila Velha, lá onde havia nascido e crescido, eu morava em Brasília, não ligava para eles e eles não me ligavam. Escrevi várias cartas sem destinação, ficaram todas nos correios junto as cartas das crianças para o Papai Noel. Ah... O natal, uma data meio triste que antecedia o ano seguinte, eu sempre esperava pelo ano seguinte com a esperança de que algo novo fosse realmente acontecer, fui o mesmo patético homem desde que me lembro como homem. Diversão? Encher a cara com pessoas fúteis, contratar serviços sexuais, comer, beber, fumar... Entendia que no mundo existiam três tipos de poder, o poder bélico, que eu não tinha, o poder monetário, que não era o suficiente pra que eu pudesse comprar a minha liberdade, e o ultimo que era o mais perigoso de todos, o poder da informação, resumindo, tiro no peito, queima de arquivo. A vida eu agradeço  a oportunidade de ter chegado até a morte.

- Memórias póstumas de Américo Quase Vinte.

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